DANIELA SPUDEIT: PROFISSÃO BIBLIOTECÁRIA


É indiscutível o poder de comunicação das redes sociais e a possibilidade de aproximar pessoas por afinidades. Se agora faço essa afirmação é apenas para dizer que foi por esse meio que tive o privilégio de conhecer a Daniela Spudeit. Em 2012, ela foi uma das organizadoras do Bibliocamp Floripa e desde esse período passei a acompanhar registros de sua atuação. Minha admiração porém se formalizou quando assisti uma entrevista em que ela apresentava de forma muito desenvolta, informações sobre a área biblioteconômica, mas veio também pela  gratidão ao apoio recebido durante a luta com o Movimento Abre Biblioteca. Agora já nos conhecemos pessoalmente e temos um carinho mútuo, mas é por considerá-la uma Bibliotecária Fora de Série que a convidei para participar dessa seção no Blog Caçadores de Bibliotecas que reúne algumas das profissionais brasileiras que fazem o ofício da Biblioteconomia com grande paixão. 

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1. Conte-nos onde nasceu, cresceu e como foi a sua relação com a leitura nos primeiros anos. 

Nasci em Porto Alegre (RS), mas aos 14 anos fui morar em Florianópolis (SC) com minha família. Meus pais sempre me incentivaram muito à leitura desde que me conheço por gente. Lembro-me de histórias marcantes de livros infantis na época da alfabetização, mas não lembro os títulos. Minha mãe, apesar de ter estudado somente até a quarta série, sempre leu muito e herdei dela o gosto pela leitura. A Coleção Vagalume, li toda durante a quinta série e vivia frequentando a biblioteca da escola para pegar esses livros.

2. Quando você teve acesso a uma biblioteca pela primeira vez?

Foi em 1989 quando eu tinha 10 anos, estava na quarta série e estudava numa escola adventista. Não me lembro de muitos detalhes, apenas do espaço e do cheiro daquela biblioteca cheia de livros que eu adorava, mas naquela época não pensava em seguir a profissão.

3. O que lhe motivou a escolher o curso de Biblioteconomia?

Meu caso é o típico “caí de paraquedas no curso”. Para mim era isso, mas Deus já tinha trilhado minha trajetória profissional, eu só não tinha maturidade para entender o que eu estava fazendo na Biblioteconomia em 1997. Tudo começou em setembro de 1996 quando eu e mais algumas amigas estávamos concluindo o terceirão e tínhamos que escolher o curso para inscrição no vestibular. Eu tinha certeza que queria fazer Administração e essa foi minha primeira opção. Porém, na época do vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC tínhamos que colocar a segunda opção e aí pensamos na Biblioteconomia não tínhamos noção do que era. Escolhemos esse curso porque era noturno, eu gostava de ler e queria liberdade para sair à noite. Imagina eu tinha 16 anos, não tinha maturidade para escolher uma profissão. Acabou que entramos na segunda opção eu e uma das minhas amigas, só que ela desistiu e eu continuei, comecei a fazer estágios logo no primeiro semestre e fui gostando do curso, me apaixonando cada vez mais e hoje, sou muito realizada e sei que foi Deus que me guiou nesse caminho.

4. Que disciplina mais gostava quando era estudante?

Sempre gostei da área de gestão, justamente porque queria fazer Administração, era algo que me chamava atenção na Biblioteconomia e eu gostava de todas as disciplinas voltadas para essa área. Mas também fui uma ótima aula das disciplinas de catalogação e classificação, que diga a professora Estera e Araci da UFSC. Desde a primeira fase sempre fiz estágios durante todo o curso, ao todo foram oito estágios em vários tipos de unidades de informação e isso me ajudou muito. Creio que enquanto estudante isso foi um diferencial para eu alinhar a teoria e a prática,teve época que eu fiz três estágios ao mesmo tempo e estudava à noite, então quando me formei estava preparadíssima para qualquer área de atuação.


5. Que tipo de biblioteca tem mais afinidade (escolar, pública, universitária, especializada, etc)

Tive experiência de estágio em todas as tipologias de bibliotecas e gostei de todas, algumas públicas e outras privadas. Não tive problemas com nenhuma por onde passei e trabalharia em qualquer uma delas tranquilamente. A que tive mais afinidade foi biblioteca universitária e foi lá que me realizei como profissional, atuando inclusive por treze anos como gestora. 


 6. Conte-nos um pouco de sua trajetória profissional.

Quando entrei na faculdade em 1997 fiz estágios em diversos espaços, desde biblioteca pública, arquivo público, biblioteca escolar, biblioteca especializada, arquivo empresarial, arquivo jurídico, biblioteca universitária e também atuei como consultora. Antes mesmo de estar formada, em 2000 consegui um emprego de auxiliar de biblioteca em uma biblioteca escolar que depois passou a ser universitária, fui promovida a bibliotecária de lá quando me formei e fiquei 13 anos nessa instituição. Paralelo a isso trabalhei como consultora para organização de acervos particulares e para organização de bibliotecas para outras instituições. Entre 2003 e 2006 fiz outra graduação (licenciatura em Pedagogia), pois como trabalhava na biblioteca escolar/universitária tinha muita vontade de aprender mais sobre esse universo que envolve o processo de ensino-aprendizagem para que pudesse compreender e melhorar minha atuação como bibliotecária auxiliando professores e alunos. Aí tive minha filha em 2004 e durante minha licença-maternidade fiz Especialização em Gestão de Bibliotecas na Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Sempre fui emendando uma coisa na outra, pois sempre gostei muito de estudar. Em 2005 comecei a participar de eventos da Associação Catarinense de Bibliotecários (ACB) e fui me envolvendo com as questões políticas e sociais da profissão, mas só acompanhava de longe, observando. Foi em 2008 que entrei como diretora técnica da Associação e de lá não saí mais, me identifico muito com o movimento associativo, acima de tudo com a valorização e consolidação da nossa profissão. Coordenei o Painel Biblioteconomia em Santa Catarina nesse mesmo ano que é o maior evento da área do sul do país e o tema do evento era justamente A atuação política dos bibliotecários. E foi isso que me motivou a entrar para o mestrado e pesquisar na linha Profissionais da Informação, em 2009. Mesmo ainda trabalhando como bibliotecária, eu dava aula de Metodologia Científica em cursos técnicos e era diretora da ACB. Em 2010, terminei o mestrado em Ciência da Informação, fiz uma pós em Didática do Ensino Superior e comecei a me preparar para o concurso, pois o mestrado me despertou a vontade de ser professora universitária. Porém, eu tinha pouca experiência docente e pouca publicação, o que pesa no concurso para professor, então passei a me dedicar a isso. Fiz processo seletivo para professora substituta na UDESC em 2011 quando fui aprovada e minha carreira como professora na Biblioteconomia finalmente começou. Em 2012 meu foco era passar na primeira turma do doutorado em Ciência da Informação na UFSC, porém, não consegui entrar, eram somente cinco vagas, então passei a estudar para concurso público de professor. Em 2013 fiz dois concursos, um na UFC, em Fortaleza e outro na UNIRIO, no Rio de Janeiro. Passei em primeiro lugar na UNIRIO e assumi a vaga no dia 15 de outubro de 2013, dia do professor, e agora estou feliz da vida como professora no Departamento de Estudos e Processos Biblioteconômicos da UNIRIO. Creio que pela minha experiência como bibliotecária e atuação no movimento associativo, agora como professora efetiva conseguirei plantar umas sementinhas para ajudar a formar bibliotecários mais atuantes contribuindo para solidificar nossa profissão na sociedade.

7. Que conselho daria para uma pessoa que deseja seguir a carreira bibliotecária?

 A Biblioteconomia é uma profissão como qualquer outra que exige perfil e amor, pois assim como acontece com outras profissões tem o período de idealização e depois de formados é que conhecemos a realidade. Entretanto, se você tem perfil e amor você segue em frente transpondo os obstáculos, independente do salário ou das condições de trabalho, pois ambiente e estabilidade profissional é você quem faz, tendo atitude, dedicação e perseverança. Existem dificuldades como em qualquer profissão, mas quando a gente faz o que gosta essas dificuldades se transformam em desafios que você vai vencendo, aprendendo e se transformando. Não me vejo atuando em outra profissão e agora como professora vou poder passar o entusiasmo de recém formada que me acompanha há 13 anos para meus alunos e mostrar que muitas vezes a ATITUDE é o que faz a diferença num profissional e complementa com o conhecimento e habilidade obtida numa faculdade.

8. Qual a biblioteca mais fantástica que já visitou e a que sonha ainda conhecer?

Não tenho grandes pretensões em conhecer bibliotecas estrangeiras, mas tenho costume de sempre quando viajo visitar a biblioteca local para verificar a situação, conhecer a/o bibliotecária/o, etc. Eu tinha muita vontade de conhecer a Biblioteca São Paulo e tive a honra esse ano. Cheguei a me emocionar com a quantidade de pessoas na biblioteca num domingo à tarde e pela estrutura que ela oferece, tudo aquilo que imaginamos que uma biblioteca deve ter. Lógico que tinha vontade de conhecer a Biblioteca Nacional pela história e glamour que ela representa e essa eu conheci ainda quando era estudante. Fora do país quero conhecer a Library of Congress, também a Biblioteca de Alexandria e outras bem modernas que tem na Europa.


9. Qual sua opinião sobre o contexto atual da profissão?

Nunca tivemos um momento tão bom e isso me entusiasma muito. Creio que temos toda a competência necessária para fazermos um trabalho de excelência atuando junto aos nossos tradicionais espaços e fazendo a diferença nas comunidades e organizações, mas também podemos ir além atuando em outros campos e mostrando para a sociedade do que somos capazes e como podemos contribuir para a melhoria da qualidade de vida das pessoas proporcionando acesso, disseminação e mediação da informação. Basta querer fazer isso, ou seja, ter ATITUDE, porque nada vai adiantar ficarmos em nossos locais de trabalho reclamando da vida, do chefe, do marido, da associação, da anuidade do conselho de classe, do professor, da faculdade que fizemos, etc. Devemos buscar a capacitação contínua e nos engajarmos na lutar por melhores condições de vida e de trabalho de forma colaborativa. Devemos exercer nosso lado político junto às entidades de classe e lutar pelo que queremos e literalmente fazer a nossa parte.

10. Como você vê a atuação da biblioteca pública de sua cidade? 

Na minha cidade tem duas bibliotecas públicas com ótimos bibliotecários, uma estadual e outra municipal. Ambas são atuantes dentro dos seus espaços apesar de receberem poucos recursos e passarem dificuldades como ocorrem com muitos órgãos públicos. Creio, porém que as bibliotecas em geral precisam ir às ruas, sair das quatro paredes e se inserir em ações com a comunidade, com as escolas, com a população, até para que sejamos mais valorizados e vistos pelos gestores públicos para que a comunidade seja parceira da biblioteca e exija do vereador/ prefeito, deputado/governador uma melhor estrutura e mais bibliotecas públicas espalhadas pela cidade.

11. Há algum bibliotecário (a) que você considera fora de série?

Admiro os bibliotecários que tem ATITUDE, não vou citar nomes para não esquecer ninguém, mas aqueles que separam um tempo de suas vidas atribuladas para se dedicarem de forma voluntária à profissão e à sociedade, tem todo meu respeito e admiração.

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