CAROL SILVA - PROFISSÃO BIBLIOTECÁRIA

E o primeiro post de 2022 vem pra dar sequência a um dos quadros que mais gosto no Blog Caçadores de Bibliotecas, o Bibliotecárias Fora de Série, que já apresentou tantas bibliotecárias inspiradoras. E a entrevista da vez é com a Bibliotecária Carol Silva, criadora do Carolê_Literatura Negra Infantil  que apresenta leituras de livros do universo infantil engajados na luta pela representatividade e autoestima de crianças e jovens, instigando a atenção quanto aos aspectos de negritude, encantamento com a ancestralidade, o autoconhecimento e autoestima. Um trabalho ímpar. 
Carol e eu nos conhecemos em 2015 durante o Bibliocamp Recife, mas nos aproximamos graças a uma outra Bibliotecária amada: Daiane Rebelo. Desde o primeiro momento percebemos grande afinidade e desde lá não nos largamos. Hoje é aniversário da Carol e já faz alguns dias que estou com o resultado de sua entrevista, que esperei para postar hoje e na qual aproveito para desejar que nesse dia especial sua essência  esteja plena de amor, garra e sonhos. Com vocês, Carol Silva (Carolê): 


1. Conte-nos onde nasceu, cresceu e como foi a sua relação com a leitura nos primeiros anos.

É interessante esta pergunta porque o meu contato com a leitura literária já veio bem tardia em relação ao que acontece com as crianças hoje. Infelizmente não tive uma família leitora que me adotou na cidade de Olinda-PE, onde passei uma grande parte da minha vida. Porém a educação escolarizada sempre me foi garantida por direito e o brincar, principalmente. E nem tive uma escola que também tivesse como foco ações que incentivasse a leitura. Ressalto que no Ensino Médio, comecei a sentir a Literatura Brasileira, porém com apenas aquela finalidade que era o vestibular, mas que já estava provocando algo em mim.

2. Quando você teve acesso a uma biblioteca pela primeira vez?

Complementando a pergunta anterior, foi na biblioteca que me tornei leitora. O primeiro acesso foi na biblioteca de Artes e Comunicação da UFPE, porém tive experiência com leituras mais voltadas para a nossa área de atuação. Sendo que na Biblioteca Pública do Estado, sabia que ali era onde eu queria estar. Ter a possibilidade de levar os livros para casa, apresentar para as amigues, conversar com quem me indicava, ficar na expectativa por novas autorias e descobrir quem eu não conhecia. Sem dúvidas, este espaço social teve e tem um sentido relevante na minha formação humana.

3. O que lhe motivou a escolher o curso de Biblioteconomia?

Brinco dizendo que foi a Biblioteconomia quem me escolheu. Pois queria muito cursar Letras, sendo que não consegui a vaga. Até que meu amigo Rafael Oliveira, hoje Bibliotecário do IFPE, tinha estudado comigo no Ensino Médio e me falou o quanto a Biblioteconomia tinha muito haver comigo. E digo que ele tinha razão e quem tem um amigo tem tudo, né?

4. Que disciplina mais gostava quando era estudante?

Gosto de dizer que até hoje adoro Fundamentos da Biblioteconomia, História dos Registros do Conhecimento, Informação e Sociedade, Ações e Bens Culturais, Serviços de Referência, Seminário de Leitura. Sempre acreditei numa Biblioteconomia com posicionamento político.

5. Que tipo de biblioteca tem mais afinidade (escolar, pública, universitária, especializada, etc)

Sempre tive envolvimento por bibliotecas comunitárias e escolares.

6. Conte-nos um pouco de sua trajetória profissional.

Penso que é um reflexo das minhas vivências desde a infância até na relação criada no meio público universitário que me permitem ser quem eu sou e como atuo na biblioteca, como penso este local de forma democrática e plural. Digo que ainda está sendo um processo, de muitas inquietações, transgressões, tensões e entendimentos como as relações se tecem nas áreas da Cultura e Educação.

7. Que conselho daria para uma pessoa que deseja seguir a carreira bibliotecária?

Não é fácil esta pergunta. Pois não há um manual de receita, rs. Acredito que a pessoa deve fazer sempre um mergulho interior, um autoconhecimento e somar à curiosidade em conhecer a atuação desta/e profissional em diversos espaços.

8. Em que momento você desmistificou o fazer bibliotecário, haja vista que a maioria das pessoas ingressa na universidade acreditando que o ambiente de trabalho está condicionado somente a livros e espaços de bibliotecas?

Tive o privilégio durante a graduação de atuar em um laboratório de pesquisa no Departamento de Ciência da Informação da UFPE que desenvolvia projetos dentro da própria universidade quanto com instituições públicas e privadas, no uso das tecnologias voltadas para a preservação da memória. Estava ali aprendendo outras linguagens, vivenciando o híbrido, vendo como as relações humanas aconteciam, impactada com as máquinas, ou seja, vivendo uma revolução digital, algo que não sonhava em ter acesso e esta experiência estourou a minha bolha.

9. Você acha que uma pessoa que escolhe essa profissão tem que gostar de ler? Justifique sua resposta

Acredito que a leitura não apresente este fim utilitário, de gostar ou não, mas de o que você vem lendo? A gente lê o mundo, né? Desta forma de se compreender enquanto humanidade e do poder desta arte em nos transformar.

10. Qual a biblioteca mais fantástica que já visitou e a que sonha ainda conhecer?

A que mais me representa é a da escritora Inaldete Pinheiro de Andrade, escritora preta, que fica localizada em seu apartamento no Recife, mas que já se encontra em um projeto para se tornar acervo na UFPE. E a que sonho em conhecer…te digo que cada uma que eu for conhecendo se torna especial para mim, pois cada uma tem uma história para contar.

11. Conte-nos sobre seu trabalho com o CaroLê.

Quando falo sobre o CaroLê Literatura Negra é algo que venho dando continuidade ao que a minha ancestralidade foi construindo para as nossas comunidades negras ao redor do mundo que é a nossa resistência em meio a tantas formas de nos anularem. Quando criança sofri vários racismos e não sabia como me defender e isto me afetava ao ponto de me machucar e achar que o erro ou a negação seria a minha existência. Hoje como mulher preta vinda de uma herança africana reconheço a importância deste projeto em empretecer a literatura desde a infância, em poder apresentar, conversar, incomodar com histórias escritas pelo meu povo, em poder contar como nós crianças pretas podemos ser quem e o que a gente quiser!

12. Dentre os tantos livros que você já leu, cite um e recomende.

Difícil indicar apenas um, rs. Vou falar do livro A rainha Dandara e a beleza dos cabelos crespos da escritora preta Recifense Dayse Moura e da ilustradora Rosa Tenório, que foi relançado esta ano (2021) pela Editora Universitária da UFPE. Tive o prazer de fazer uma análise desta obra no trabalho final da pós em Literatura Infantil e Juvenil e participar do seu segundo lançamento via meet com a escritora e outres convidades. Trago a importância dela por buscar positivar as nossas crianças negras que através de seus cabelos há valores e saberes que permitem conhecer a sua verdadeira origem.

13. Qual sua opinião sobre o contexto atual da profissão?

Observo que é um momento muito duro que estamos atravessando política e economicamente, infelizmente vendo colegas sem empregos. Também não vou jogar confetes e serpentinas com ideias de coaching, mas independente de estar empregado, empreendendo ou não, é preciso estarmos alinhando o nosso fazer com o que está acontecendo no cenário hoje. Estudar sempre.

14. Como você vê a atuação da biblioteca pública de sua cidade?

Faz pouco tempo que moro na cidade de Caruaru-PE, mas já me relataram sobre a situação da biblioteca que se encontra fechada. Pretendo escutar os moradores locais sobre esta problemática.

15. Há alguma bibliotecária (o) que você considera fora de série?

A minha bibliotecária fora de série é você Soraia Magalhães! Desde a minha graduação acompanho o teu blog Caçadores de Bibliotecas e o teu engajamento que me deixavam escapar: Que mulherão da p****! Sempre senti a tua energia linda daqui 🖤

16. Do que mais gosta na sua profissão?

Das pessoas. De ser uma confidente de certa forma pra elas, sabe. De poder oferecer algo q é tão absurdo de caro neste país, de romper imaginários, curar e facilitar outras possibilidades.

17. Fique à vontade para fazer seus comentários finais.

Agradeço imensamente por este momento tão ímpar que já trouxe tantas e tantos bibliotecáries que são referências pra gente e fazer parte é uma honra para mim. Soraia, estaremos aqui juntas lutando e com esperança para que o Fora Bolsonaro se realize neste ano que virá 🚩✊🏿


Foto: acervo pessoal de Carol Silva

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