PÂMELA BASTOS - PROFISSÃO: BIBLIOTECÁRIA

O blog Caçadores de Bibliotecas sempre me deu muito e entre tantas coisas marcantes, a aproximação com pessoas admiráveis tem sido as melhores conquistas. É por isso que para encerrar a seção Bibliotecárias Fora de Série, do ano de 2020, compartilho a entrevista da Bibliotecária Pâmela Bastos, profissional das mais sensíveis e inspiradoras que conheço, pois sabe ser doce, forte, valente, versátil e comprometida com a Biblioteconomia e com tudo e todos que estão ao seu redor. Nos conhecemos em 2011 durante a participação no Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação - CBBD, em Maceió e desde então estreitamos laços que hoje nos unem com adorável amizade. Aliás, elementos que envolvem nossa amizade estão em alguns momentos expressos nessa entrevista, pois Pâmela insistiu em fazer, contudo é graças a sua trajetória comprometida com uma Biblioteconomia engajada, multicultural e lúdica que passei a vê-la como Bibliotecária FORA DE SÉRIE e creio, sua história pode estimular outros perfis biblioteconômicos, a fazerem também a diferença na profissão. A Pam (como é carinhosamente chamada) é criadora do Bibliotecontoé contadora de histórias e é uma dessas pessoas que deixam um marco de sua presença por onde quer que passe.  Confira essa lindeza de entrevista: 


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1. Conte-nos onde nasceu, cresceu e como foi a sua relação com a leitura nos primeiros anos.

Nasci em Lagoa Santa, região metropolitana de BH. Cresci e vivi até os quatro anos em minha cidade natal e entre os 5 e 9 anos morei em Vespasiano. Aos 10 anos retornei para Lagoa Santa, onde vivi até minha fase adulta. Me recordo do primeiro livro que pude ler sozinha, aos 6 anos, quando eu estava aprendendo a ler. O livro se chamava “A fada que tinha ideias”, de Fernanda Lopes de Almeida. Lembro-me da alegria que tive ao ganhar esse livro porque é o primeiro em minha memória que eu li sozinha. Criei uma relação de afeto com ele e os que vieram após ele. Mamãe costumava ler muito seus livros de romance. Desde muito nova observei os modos de ler dela, sempre deitada e por muitas horas ela se debruçava sobre a leitura. Mamãe aprendeu a gostar de ler com meu avô, pai dela. E eu, ao observá-la, me inspirava para minhas próprias leituras. Não tive acesso aos clássicos da literatura em formato impresso na infância. Mamãe comprava muitos “livros infantis de banca” para mim. Eu os relia inúmeras vezes. Criava minha coleção simples, de poucos títulos e pouca diversidade literária, mas eram totalmente meus. Mamãe comprava para mim o que considerava que eu gostaria de ler. E o afeto dela ao me presentear, ao me escutar lendo várias vezes a mesma história e ao dizer para todos que eu já lia (com aquele orgulho de mãe), me conectou à literatura para sempre. Lembro de um livro que contava a história de uma família de Ratos, não me recordo o título. Ganhei da mamãe também vários títulos da coleção da “Bruxa Onilda”. Eu me sentia muito conectada com aquela bruxa, me sinto até hoje e compro todos os títulos que encontro. E como sou de família protestante, ganhei uma Bíblia ilustrada aos sete anos. O exemplar tinha 200 páginas, é certo que com letras e ilustrações bem grandes, mas o fato de eu ter lido em dois dias foi um motivo de muito orgulho pra minha mãe e pra mim naquela época. Lembro de como ela vibrou quando concluí, me abraçou e parabenizou. Desde que aprendi a ler, eu gostava de passar horas com os livros. Mamãe não tinha conhecimento sobre a qualidade das obras literárias, não me recordo de muitos títulos lidos antes dos 10 anos, mas me lembro muito bem de como eu me apegava a cada um dos exemplares que eu ganhava. Quando cheguei na adolescência, fui presenteada pela mamãe com alguns livros que ela havia lido na juventude e decidiu que guardaria para sua filha(o). Dentre eles: "Pollyanna", alguns títulos de Agatha Christie (que tenho até hoje) e livros de poesia. Me lembro de ler cada um deles e de me apropriar de suas narrativas como presentes de minha mãe para mim. Os poemas lidos foram usados em cartas enviadas para amores meus da adolescência. Eu os relia sempre que me apaixonava por uma nova pessoa. Também comecei a escrever poemas curtos e cartas de amor a partir dos 8 ou 9 anos. Tive meus diários. Hoje percebo o quanto a literatura/escrita me aproximou da minha mãe, o quanto esse gosto me faz entender melhor quem eu sou e de onde venho. Até me emociono ao pensar nisso.

2. Quando você teve acesso a uma biblioteca pela primeira vez?

Considero que demorei a conhecer uma biblioteca, apenas aos sete anos, quando iniciei a antiga primeira série do Ensino Fundamental. Conheci a Biblioteca da Escola Estadual Tiradentes, onde estudei da 1ª a 8ª série. Não recordo agora o nome dela, mas lembro-me bem de que ela ficava no mesmo salão do refeitório. Colocaram uma divisória que separava os dois ambientes. Era uma biblioteca pequena em tamanho, mas tinha muitos livros. Passei pouco tempo dentro dela, peguei poucos livros emprestados. Lembro que os alunos bagunceiros eram enviados para lá como castigo e a moça que trabalhava na biblioteca também era responsável por fazer as cópias das atividades no mimeógrafo. Demorei muito para conhecer outra biblioteca que não fosse aquela. Isso me deixa triste porque há uma biblioteca pública bem grande em Lagoa Santa, cidade onde se localiza a escola. Nem meus pais, nem a Escola ou outro mediador me levaram à biblioteca pública antes do Ensino Médio.

3. O que lhe motivou a escolher o curso de Biblioteconomia?

No Ensino Médio têm início nossas preocupações em relação ao curso que vamos seguir na academia. Eu pensei em Moda, até me dar conta de que eu não gostava de desenhar nada. Pensei em Letras, mas tenho preguiça da Gramática. Pensei em veterinária, mas não dou conta de ver sangue e bichos doentes. Quando eu pensei que não acharia um caminho, resolvi ler o Guia das Profissões da UFMG. Busquei pelos cursos na área de Humanas, li sobre todos e quando li sobre a Biblioteconomia, encontrei algumas referências que me agradaram muito, dentre elas, livros, organização e pessoas. Num primeiro momento, confesso que escolhi o curso pensando que eu poderia ler muito no trabalho, em segundo lugar porque eu poderia organizar espaços com livros e documentos desorganizados (sim, sou esse tipo de pessoa fissurada por organização). Em minha casa tudo recebe etiquetas: pastas de documentos, caixas de sapato, vasilhas de alimentos etc. Mas só depois de alguns períodos de curso, em uma reflexão mais profunda, me dei conta de que eu gosto de atender pessoas, de conhecer novas histórias, de pesquisar, investigar e estar disponível para prestar um serviço de informação. Gosto de conversar com as pessoas, da interação que a nossa profissão proporciona e das muitas histórias, experiências e novos conhecimentos que agregamos às nossas próprias trajetórias. Quando entrei no curso, a partir do segundo período, comecei a me dar conta de que uma paixão ainda mais intensa me tomaria: a mediação de leitura.

4. Que disciplina mais gostava quando era estudante?

Minhas duas disciplinas preferidas foram “Leitura e formação do leitor” e “Cultura e informação”. Coincidentemente, as professoras que ministravam essas disciplinas foram minhas orientadoras: a Profa. Adriana Bogliolo me orientou no projeto final do curso e em um projeto de extensão e a Profa. Maria da Conceição Carvalho foi minha orientadora de mestrado.

5. Que tipo de biblioteca tem mais afinidade (escolar, pública, universitária, especializada, etc). 

Tive a oportunidade de trabalhar em biblioteca escolar, pública e universitária e não tenho dúvida alguma de que tenho preferência pela biblioteca escolar. Em segundo lugar, no meu coração de bibliotecária, está a biblioteca pública. Atualmente trabalho em uma biblioteca escolar, onde tenho maior tempo de experiência (5 anos). A preferência está no fato de eu me sentir bem mais próxima dos leitores e atuar diretamente em projetos de incentivo à leitura.

6. Conte-nos um pouco de sua trajetória profissional.

Logo que me graduei, passei no mestrado e durante meu primeiro ano de formada, me dediquei às disciplinas e leituras para minha pesquisa. No ano seguinte, recebi o convite para assumir a gerência da Biblioteca Pública de Lagoa Santa, minha cidade natal. Foi uma experiência intensa, considerando que eu tinha 23 anos e logo na primeira biblioteca precisei gerenciar todos os processos, setores e equipe. Eu era muito nova e inexperiente, mas considero que durante aquele ano (2013) cresci muito enquanto profissional e pessoa. Foi lá que pude conhecer a profissional que eu sou. Me dei conta que gerenciar processos é mais fácil do que gerenciar pessoas. Em contrapartida, gerenciar pessoas nos ensina sobre o respeito, a ética, a compaixão. Trabalhei nessa biblioteca durante todo o ano de 2013 e tenho muito orgulho da história que construí e dos caminhos que percorri para aprender. Tenho muito orgulho de ter trabalhado na Biblioteca que frequentei durante minha adolescência. Lembro que nessa Biblioteca organizei e realizei, juntamente com a equipe, o primeiro de muitos Saraus que aconteceram na cidade, tivemos mais de 100 pessoas na biblioteca em uma mesma noite. Não couberam todas no espaço e algumas ficaram ouvindo da escada, ao lado de fora. Foi um movimento tão marcante para mim, com a presença de escritores, poetas e músicos locais. Entreguei o melhor de mim e após um ano eu tive a oportunidade de trabalhar em Belo Horizonte, em uma biblioteca de uma escola e faculdade. Em 2014 comecei então a atuar em uma biblioteca híbrida (escolar e universitária) e, mais uma vez, fui gerente. Precisei conciliar, assim como na biblioteca pública, os trabalhos administrativos de gestora, técnicos e culturais da Biblioteconomia. A Biblioteca se dividia entre o espaço destinado à faculdade e o espaço destinado à Escola. Na biblioteca escolar, realizei projetos que eu também pude realizar na biblioteca pública, como clubes do livro, bate-papo com autores, saraus, seleção e tratamento do acervo literário. Aprendi que nós, bibliotecárias (os), precisamos ser parceiras(os) das professoras(os) para criar e realizar propostas conjuntamente. Na biblioteca universitária dessa instituição, trabalhei com a gestão dos processos de compra e tratamento do acervo, atendimento ao público, treinamento dos usuários e visitas do MEC. Por três anos atuei nessa instituição, uma experiência grandiosa e muito importante para eu compreender qual é minha missão profissional. Desde a Biblioteca Pública de Lagoa Santa, eu sentia meu coração pulsar toda vez que eu podia me dedicar à mediação de leitura e na biblioteca escolar pude continuar meus estudos e trabalho nessa área. Por ter trabalhado em uma instituição que também tinha uma biblioteca universitária, fui selecionada logo depois para gerir uma biblioteca de uma faculdade da área da saúde, mas fiquei apenas dez meses nela e percebi que ali não era meu lugar. Não havia pulsar de coração com as demandas do público universitário. Eu queria voltar a trabalhar com literatura e formação de leitores, com gestão de acervo literário, de preferência em uma biblioteca escolar. E foi assim que a vida me trouxe mais uma oportunidade de trabalhar em uma escola, onde atuo há quase dois anos e uma experiência ainda mais forte e próxima dos leitores é o que venho experimentando até hoje.

7. Que conselho daria para uma pessoa que deseja seguir a carreira bibliotecária?

1º. Só faça o curso de Biblioteconomia se você gostar de trabalhar prestando serviços às pessoas, porque elas são a razão de trabalharmos. A gente precisa gostar de dialogar e ouvir o outro.

2º. Só faça o curso de Biblioteconomia se você gosta de se manter informado e buscar novos conhecimentos (pesquisar). Como bibliotecária (o), essa será uma de suas missões diárias.

3°. Só faça o curso de Biblioteconomia se você gostar de viver em meio aos livros e demais tipos de registros bibliográficos (com ou sem poeira, com ou sem ordem). Se tiver alergias, já comece a se prevenir e cuidar da saúde. Você precisará de um bom alergista para te acompanhar.

4°. Só faça o curso de Biblioteconomia se você não tiver pânico da desordem, afinal, antes da nossa organização, a desordem sorri pra gente diariamente.

5º. Só faça Biblioteconomia se você gostar de Bibliotecas. A probabilidade de você trabalhar em uma é muito maior do que você imagina.

6°. Só faça Biblioteconomia se você estiver disposta(o) a ler de tudo (e sim, incluo aqui a literatura). Penso que todas(os) as(os) bibliotecárias(os) devem ser leitores, ainda que atuem em áreas mais técnicas ou tecnológicas.

7° . Só faça Biblioteconomia se o seu coração te indicar esse caminho.

8. Em que momento você desmistificou o fazer bibliotecário, haja vista que a maioria das pessoas ingressa na universidade acreditando que o ambiente de trabalho está condicionado somente a livros e espaços de bibliotecas?

Acho que desmistifiquei o fazer bibliotecário durante a graduação, quando me deparei com disciplinas voltadas para o tratamento da informação em suportes para além dos livros. Cursei algumas disciplinas voltadas para o tratamento de informações em banco de dados, mas confesso que por mais que professoras(es) dissessem que poderíamos trabalhar em outros lugares que não as bibliotecas, eu já havia decidido que essa não seria a minha realidade. Me lembro bem de um professor nos dizendo que uma bibliotecária que foi sua aluna havia se mudado para o exterior e trabalhava com o desenvolvido de uma base de dados que armazenava e disponibilizava (vendia) informações sobre fornecedores e preços de ingredientes para grandes redes de padarias. Incrível, não é? Nossa formação nos prepara para tratar e disponibilizar todo tipo de informações. É certo que para cada uma delas precisamos buscar nos aprofundar em suas especificidades para catalogarmos e conhecermos o tipo de “usuário” que precisamos alcançar.

9. Você acha que uma pessoa que escolhe essa profissão tem que gostar de ler? Justifique sua resposta. 

Essa é uma pergunta delicada de responder. Conheço colegas que se graduaram comigo e dizem não gostar de ler. Eles se referem à leitura de literatura. Normalmente, estudantes de biblioteconomia que dizem isso, acabam por escolher atuar em áreas mais técnicas e tecnológicas, mas penso que para qualquer profissão, precisamos estar disposto a ler de tudo (sejam notícias, livros técnicos e literatura). Penso que a apreciação da arte literária em especial pode contribuir muito para nossa constituição enquanto indivíduos e, consequentemente, enquanto profissionais. Confesso sentir um aperto no peito quando conheço uma bibliotecária(o) que diz não gostar de ler, mas receio julgar ou ser determinista em minha colocação. No mínimo, penso que uma bibliotecária(o) precisa ter disposição para ler de tudo, ainda que não tenha gosto pela leitura. A profissão requer essa disposição e quanto menos a (o) bibliotecária(o) gostar de ler, mais desgostoso ela(e) pode ficar com a profissão.

10. Qual a biblioteca mais fantástica que já visitou e a que sonha ainda conhecer?

Inicio a resposta lamentando que não conheci muitas bibliotecas famosas. Conheço grande parte das bibliotecas públicas de BH, a Biblioteca Pública Infantil e Juvenil, a Biblioteca Estadual de Minas Gerais, a maioria das bibliotecas dos centros culturais de BH e bibliotecas públicas de cidades próximas da região metropolitana e cidades históricas de MG. Tive a alegria de conhecer a Biblioteca Nacional (BN) no RJ que, até o momento, é a maior e mais linda que já conheci. Fiz uma visita guiada e amei conhecer especialmente o Setor de Obras Raras. Quem cursa Biblioteconomia sabe que, desde o início do curso, um dos nossos primeiros desejos é conhecer a BN. Agora as bibliotecas que sonho conhecer são muitas, começando pelo Real Gabinete Português de Leitura (RJ), a Biblioteca do Vaticano, a Biblioteca Alexandrina (Alexandria, Egito), a Biblioteca Joanina (Coimbra, Portugal) e tantas outras. Fato é que desde que conheci a Soraia Magalhães, a maior caçadora de bibliotecas do mundo, despertou em mim o desejo de conhecer as bibliotecas de cada cidade por onde eu passar, no Brasil e fora dele.

11. Dentre os livros que você já leu, cite um e recomende.

Citar apenas um é muito desafiador (risos). Mas vou subverter e indicar cinco, não que sejam os meus preferidos, há muitos outros tão maravilhosos quanto estes, porém é como quando vamos contar histórias, são elas que decidem quando querem ser contadas. Neste momento, são estes livros que me pedem para ser indicados:

》"A extraordinária jornada de Edward Toulaine”, de Kate DiCamillo: peguei emprestado na biblioteca da Escola onde trabalho. É a história de um coelho de porcelana que pertencia a uma criança que o amava muito. Mas o boneco, por sua vez, era muito egoísta e não havia aprendido a amar. A narrativa conta sobre todas as experiências que esse coelho precisou ter para entender e sentir o amor.

》“O muro no meio do livro”, de Jon Agee: comprei há algumas semanas e acabei de relê-lo. É um livro escrito para crianças e como eu sempre digo, uma boa literatura infantil agrada leitores de todas as idades. Às vezes, tudo que precisamos é tomar a coragem de conhecer o outro lado por nós mesmos.

》“Patos Selvagens”: sou suspeita porque foi escrito por Samuel Medina, meu companheiro, mas eu não indicaria se não fosse realmente um conto instigante, misterioso e com muita qualidade literária.

》“O peso do pássaro morto”, de Aline Bei: meu companheiro recebeu a indicação de uma amiga e gostou tanto que me presenteou com o livro. Me lembro de andar nas ruas lendo porque eu não queria parar de ler. Em determinado momento da história, precisei parar e entrar em uma loja para chorar. As atendentes ficaram me olhando chorar sem entender e eu tive aquela oportunidade maravilhosa de indicar a leitura e explicar o motivo da emoção.

》“Olhos d’água”, de Conceição Evaristo: Uma escritora de Belo Horizonte que todos precisam conhecer. É um livro de contos, com histórias vividas por mulheres negras que experienciam a miséria, a fome, a violência, as perdas para a morte, a exclusão, o racismo. A realidade das experiências é apresentada às leitoras e leitores com uma escrita poética. Precisamos conhecer a obra, a autora e essa realidade.

12. Qual sua opinião sobre o contexto atual da profissão?

Atualmente tenho buscado atuar politicamente em meu fazer como bibliotecária. Já estive no lugar apenas de criticar, mas neste ano tive a oportunidade de conhecer profissionais politicamente engajados e que lutam por valorização, direitos do profissional e tomam medidas que vão além do discurso. Tenho aprendido muito com eles. Não estou satisfeita com o modo como o CFB atua. Considero que o Conselho Federal faz vistas grossas para muitas das demandas das(os) bibliotecárias(os), mas nesse lugar político e de resistência que me coloco, consigo visualizar melhor como podemos lutar pela nossa profissão. Sinto que como classe, ainda há desunião, mas tenho esperança nos movimentos que estão acontecendo. Como lutas para 2021 ainda temos muitas pautas, dentre elas: melhoria dos salários dos profissionais concursados e privados, avaliação criteriosa pelo MEC e CFB dos cursos novos de Biblioteconomia com duração menor que 4 anos e à distância e exigência de abertura de vagas de concurso estadual para bibliotecária(o) escolar em Minas Gerais.

13. Como você vê a atuação da biblioteca pública de sua cidade?

Em Belo Horizonte temos muitas bibliotecas públicas: A Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais e 22 bibliotecas municipais da Fundação Municipal de Cultura da Prefeitura de BH, sendo elas: a Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de BH, as bibliotecas do Museu da Moda, Centro de Referência da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado, MIS Cine Santa Tereza, Escola Livre de Artes e de 17 centros culturais localizados em vários bairros de Belo Horizonte. Considero a quantidade de bibliotecas muito importante para nossa cidade, principalmente aquelas que atendem bairros mais afastados do centro. Todas as bibliotecas têm bibliotecários responsáveis por elas. Só lamento que nem todos os profissionais estejam in loco. Essa é mais uma demanda que a classe deve se unir e pressionar o Conselho Regional para exigir da Prefeitura a contratação. Como profissional e leitora que utiliza os serviços de algumas bibliotecas públicas da cidade, considero que há ótimos profissionais nelas e uma busca constante para oferecer atendimento de qualidade, dentro de suas possibilidades. Mas percebo que não há uma valorização dos setores e profissionais por parte da Prefeitura, de modo que muitos processos e melhorias são adiados ou desconsiderados. A própria Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de BH está em um prédio que, atualmente, não tem estrutura para recebê-la. Isso certamente impacta nos serviços oferecidos por ela.

14. Há alguma bibliotecária (o) que você considera fora de série?

Não me faltam boas referências na área de Biblioteconomia, mas hoje quero mencionar duas bibliotecárias com as quais tenho muita proximidade: a primeira é a Diná, bibliotecária responsável pelo Setor de Obras Raras e Coleções Especiais da UFMG. Ela foi a primeira bibliotecária que conheci, antes mesmo de cursar Biblioteconomia. Os diálogos com a Diná foram muito importantes para eu decidir seguir essa carreira também. Ela foi minha chefe em estágios e é uma grande amiga e profissional por quem tenho muita confiança e respeito. Há muitos anos acompanho os trabalhos que ela realiza e percebo o quanto é apaixonada e dedicada aos livros, aos conhecimento, à preservação e divulgação do nosso patrimônio bibliográfico. A segunda bibliotecária fora de série que quero homenagear citando aqui é a que me entrevista, Soraia Magalhães, uma leitora voraz, engajada nas lutas políticas da classe, uma ótima escritora, bibliotecária, pesquisadora, mãe e avó. Uma bibliotecária que realiza tudo que sonha com muito amor. Fico admirada com a força, a coragem e a inteligência da Soraia, que percorre as bibliotecas do mundo inteiro e compartilha tantos conhecimentos com tamanha generosidade. Sou suspeita para dizer sobre ela porque somos amigas de longa data, mas quem acompanha essa mulher, sabe bem que tudo que estou falando aqui é verdade. Sou uma eterna admiradora dessa Caçadora de Bibliotecas.

15. Do que mais gosta na sua profissão?

Sempre respondo três coisas a essa pergunta, mas começarei dessa vez com a mais importante delas: amo atender o público, estar em comunicação constante com as pessoas. Sou muito comunicativa e me sinto muito bem quando ajudo as pessoas a encontrarem o que precisam. É certo que escolhi a profissão inicialmente por causa dos livros e da organização. Pensa numa pessoa que gosta de organizar. Sou eu. E até para ler preciso estar em um lugar organizado. Mas na vida prática da profissão, toda organização, pesquisa, tratamento da informação só existem por um motivo: porque temos pessoas para acessar todo conhecimento que é produzido. As pessoas dão sentido à informação em todos os tipos de suportes.

16. Fique à vontade para fazer seus comentários finais.

Agradeço à Soraia, essa amiga que acredita tanto e confia em meu trabalho. Em tempos de pandemia, essa parceria, troca e confiança faz a gente ter a convicção de que escolhemos o caminho certo. Agradeço pelo convite. Me sinto muito honrada por fazer parte das "bibliotecárias e bibliotecários fora de série " que moram no coração da Soraia. Toda admiração e afeto são recíprocos. Deixo aqui meu abraço a cada profissional que atua e a cada futuro profissional da nossa área. Agradeço pela leitura atenta e paciente da minha história. Me reconectei com minha essência enquanto respondia a esse questionário. Desejo que cada um que ler também se conecte consigo mesmo e com a missão que possui. Gratidão.

Foto: Acervo pessoal de Pâmela Bastos

Comentários

  1. Conheço muito dessa história, pois ouvi direto da fonte e parte dela eu acompanhei de perto. Sou feliz por fazer parte da vida da Pam antes mesmo de sermos um casal. Lembro-me quando ela foi à Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de BH pela primeira vez, para fazer sua pesquisa de mestrado. E também quando ela me disse que estava gerenciando a Biblioteca Pública de Lagoa Santa. Cada uma das bibliotecas que ela mencionou eu visitei, participando da trajetória da Pam. Eu a admiro como profissional, como mulher e como pessoa. E sou feliz por dividir meu caminho com ela. Parabéns pela ótima escolha de entrevistada, Soraia! Abraços!

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  2. Samuel, você é um privilegiado, tens uma companheira tão especial e juntos vocês são imbatíveis. Uma honra ter a Pâmela no Caçadores de Bibliotecas.

    Amo tê-los em meu coração.

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